Se Bolsonaro for preso!
Roberto Malvezzi (Gogó)
Pertenço ao Brasil dos delirantes! Não tenho nenhum prazer em ver alguém preso. Se Bolsonaro e seus asseclas forem presos, não vou soltar rojão, nem comer churrasco, nem mesmo soltar um sorriso, ainda que ele tenha rido dos asfixiados na pandemia.
Meu sonho é ver todo brasileiro com vida digna, alimentando-se com decência, tendo uma casa adequada para morar, um trabalho bem remunerado, uma velhice com uma aposentadoria suficiente, um atendimento médico digno, poder estudar os filhos, tendo tempo para ficar com a família e um bom tempo de lazer. Enfim, um país mais justo!
Sonho que os militares deixem de perturbar a paz do povo brasileiro, deixem de nos ameaçar com novas e violentas ditaduras, historicamente promotoras de injustiças e violações de direitos fundamentais da pessoa humana.
Sonhando que a Faria Lima e o Banco Central conseguissem enxergar a população de 210 milhões de brasileiros, evitando boicotar o que deu certo para todos, controlando a própria ganância especulativa e reconhecendo que o Brasil e o mundo são muito mais extensos e complexos que a matemática dos mercados.
Sonho com uma mídia nacional decente! É doentio beber uma dose de estricnina todos os dias ao abrir as manchetes da mídia nas sutilezas e grotescarias (neologismo consciente) de suas matérias, operando uma militância política em defesa dos ideais neoliberais e da especulação financeira, parindo bilionários da noite para o dia. Veladamente, defendendo a ditabranda!
É cruel ver deputados e senadores, cujo desaprovação é de 87% pelo povo brasileiro, ousando pedir o impeachment de um presidente que é mais bem avaliado que o próprio Congresso. Enquanto existir o mecanismo do impeachment, esse país não terá mais paz política.
Sonho que muitas igrejas deixem de ser “aparelhos ideológicos da direita”, verdadeiros currais eclesiais, onde os líderes decidem pelo povo em quem eles devem votar. Que o Evangelho anunciado ainda seja o de Jesus de Nazaré, não uma ideologia de oportunistas e exploradores de pessoas de boa fé.
É duro ver grande parte das esquerdas defendendo a exploração do petróleo na foz do Amazonas, sob o pretexto de financiar a transição energética, mesmo sabendo que é a queima de combustível fóssil a principal causa do aquecimento global. Essa é a utopia maior, que a Terra seja não só a nossa Casa Comum, mas também a mãe da humanidade e de todas as formas de vida que ela abriga nesse inimaginável Universo.
Sonho com uma agroecologia adequada a cada bioma, com alimentos sadios e limpos nas mesas, com água para todos, com uma temperatura adequada para a vida humana e todas as outras formas de vida, porque esse é o roteiro da vida.
Sonho com o respeito aos territórios indígenas, quilombolas e de todas as comunidades tradicionais, porque são elas as amantes e cuidadoras da exuberância florestal que ainda nos resta.
Sim, que o Brasil voltasse a ser feliz, que tivéssemos respeito de uns pelos outros, que pudéssemos cumprimentar os vizinhos, desejar o bem aos adversários e inimigos e dizer com o poeta: “What a Wonderful World”!
Enfim, vamos mantendo essas utopias arcaicas e delirantes, que só os poetas e os justos sonham, às vezes na madrugada, tantas vezes transformadas em pesadelos ao romper do dia.